Suzano e IP: Uma reação exagerada
Escrito por: Pedro Nogueira

No início do mês de maio noticiou-se que a Suzano teria interesse em adquirir a International Paper (IP), produtora de celulose fluff e embalagens (informação confirmada pela empresa). Segundo a notícia (valores não confirmados pela Suzano), a Suzano faria uma oferta de USD42 por ação da IP, ou USD15 bilhões em valor de mercado. Dado o endividamento líquido de aproximadamente USD5 bilhões da IP, o valor da empresa adquirida seria próximo de USD20 bilhões.

Já era sabido que a Suzano planeja adentrar mais à fundo na cadeia de valor de papel e celulose, de modo a reduzir a volatilidade de seu EBITDA. Também era sabido que dadas as condições do mercado brasileiro, tal movimento se daria por meio de uma aquisição de ativos internacionais. Já que o processo de alocação de capital da Suzano foi detalhado em nossa carta de janeiro de 2024, nos limitaremos a fazer comentários marginais, sem adentrar em suas minúcias.

Um ponto digno de repetição é que seu extenso track record de aquisições e alocação de capital é um dos mais respeitáveis de que temos notícia. Para citar alguns exemplos, podemos falar sobre a exitosa expansão de seu land banking, a aquisição da Fíbria (empresa maior que a Suzano), Ibema, Facepa e dos ativos de tissue da Kimberly-Clark (KC). Há de se lembrar, também, da criação e investimento na produção de fluff de fibra curta (tradicionalmente feito de fibra longa) e o próprio Projeto Cerrado que, apesar de ainda não operacional, já é consenso em termos de sua estrondosa capacidade de geração de caixa.

Fica evidente, então, que a capacidade da empresa de gerar valor, alocando o seu capital de forma disciplinada, não deve ser subestimada. Poucas são as empresas com a visão de longo prazo e disciplina da Suzano. Apesar de soarmos repetitivos, acreditamos que essa digressão é bem-vinda, ainda mais à luz dos eventos recentes.

Mesmo ainda cercado de incertezas, achamos importante descrever a IP, como ela se adequa aos requisitos da Suzano para um investimento e como a última seria capaz de executar tal movimento com maestria, se tornando um colosso ainda maior do que já é.

International Paper

A IP é a maior produtora de fluff (fibra longa) do mundo, com 3,4 milhões de toneladas de capacidade anual, além de ser uma das maiores produtoras de containerboard e caixas de papelão, com aproximadamente 14,5 milhões de toneladas anuais de capacidade, em sua maioria fibra virgem. Em termos de custo de produção ela é extremamente eficiente, com 90% de suas fábricas e a maior parte de suas máquinas de papel no quartil de custos mais eficiente. À título de ilustração, a figura abaixo, retirada do material da empresa em seu site de relação com investidores, revela a distribuição de suas máquinas de papel por custo de produção por tonelada.

Fonte: IP

Entre 2021 e 2023, a empresa gerou, em média, USD1,14 bilhão em fluxo de caixa livre por ano, sendo que 2023 foi negativamente impactado pelos baixos preços de containerboard e pela queda do preço da celulose. Nos últimos 10 anos, a média do retorno sobre o capital empregado da IP é superior a 10%, acima de seu custo de capital.

De fato, a antiga estratégia comercial da empresa, de tirar proveito de seu baixo custo de produção de papel (68% a 73% do custo das caixas de papelão) e focar em volumes, apesar de ter dado certo no passado, não se mostrou exitosa nos últimos anos. Isso fica evidente na constante deterioração de suas margens. Mais recentemente, porém, houve uma mudança, de forma que a empresa passou a priorizar preços em detrimento de volumes (value over volume).

Apesar de ter ativos de papel e caixas de papelão modernos e uma reputação de ser uma boa operadora, a IP segue investindo para melhorar ainda mais suas fábricas, de forma a reduzir os custos com mão de obra e capturar ganhos de produtividade. Há razões para acreditar que tal mudança estratégica gere bons frutos nos próximos 12 a 24 meses, em termos de margens e geração de caixa.

Tomando como referência a Packaging Corporation of America (PCA), empresa focada em rentabilidade e referência em termos de margens e retorno sobre o capital empregado, entendemos que há muito a ser ganho em termos de lucratividade. Levando em consideração que a Suzano é uma excelente operadora (isso fica evidente na transformação dos ativos adquiridos da KC, em que a margem EBITDA saiu de aproximadamente 0% em 2017 para perto de 20% em 2023), temos razões para acreditar que os resultados da IP têm muito a melhorar sobre seu comando, contribuindo positivamente para os resultados da Suzano.

Para 2025, projetamos um EBITDA de aproximadamente USD2,7 bilhões para a IP, com uma margem de aproximadamente 13%, e não nos surpreenderíamos se esse número fosse significativamente maior nos anos seguintes caso a Suzano assumisse o controle da operação.

Comentários sobre o movimento

De fato, vemos benefícios numa eventual aquisição da IP, se um preço justo for pago (e acreditamos que ela só se materializaria, por parte da Suzano, se for esse o caso). O movimento não só traria maior estabilidade para o EBITDA e as margens da Suzano (algo que é evidente na Klabin), reduzindo a incerteza em relação a seus resultados, como também maior valor agregado para seus produtos.

Do ponto de vista de geração de caixa para honrar o desembolso necessário, entendemos que a Suzano é mais do que capaz de arcar com a aquisição. Aos preços supracitados (USD42/ação), a transação seria concluída a 7,1x EV/EBITDA de 2025 e caso a Suzano aumente sua oferta em aproximadamente 14% (USD48/ação ou valor da empresa de USD21,5 bilhões), sairia a um EV/EBITDA de 7,9x. Apesar de parecer esticado, pelos motivos já mencionados, acreditamos que as melhorias que a Suzano seria capaz de implementar trarão resultados que mais que compensam o valor pago. Em outras palavras, dado o potencial de crescimento do EBITDA, acreditamos que olhando múltiplos de anos mais à frente e a contribuição para o resultado consolidado de uma empresa combinada, a transação se justificaria.

Do ponto de vista da capacidade financeira da Suzano, entendemos que com a aquisição da IP, a nova empresa consolidada teria uma relação dívida líquida/EBITDA de aproximadamente 4x em 2025 e 3,4x em 2026 (sem considerar ganhos de eficiência gerados pela nova gestão), ligeiramente abaixo da banda superior permitida em sua política de alavancagem (3,5x). A capacidade de geração de caixa da Suzano após o Projeto Cerrado será tamanha que, em combinação com as operações da IP, a desalavancagem ocorrerá rapidamente e sem tropeços.

Porém, mesmo que enxerguemos com bons olhos a aquisição, também reconhecemos os riscos envolvidos, como o risco de operacionalização dos ativos, de baixas sinergias e da capacidade de absorvê-los, mesmo com sua excelente capacidade operacional.

Quando buscamos motivos para que a aquisição não seja concluída, acreditamos que um preço elevado e o potencial de perder o grau de investimento seriam excelentes candidatos. Vale destacar que o grau de investimento é o que permite que a Suzano capte dívidas a custos tão baixos, então perdê-lo não é uma opção.

Valuation e capacidade de arcar com a aquisição

Em termos de valuation, acreditamos que a combinação tende a ser positiva para a Suzano. O fato de trazer maior valor agregado para seus produtos e maior estabilidade para seus resultados, por definição, tende a reduzir o custo de capital da empresa através da redução do risco percebido em suas operações, bem como aumentar o múltiplo que a empresa negocia. Como é o caso da Klabin, que negocia a múltiplos mais elevados sem necessariamente ser mais cara que a Suzano, entendemos que a aquisição tende a melhorar a precificação da mesma.

Considerando que a empresa combinada negocie a um múltiplo de 6,5x EV/EBITDA (conservador), enxergamos um potencial de valorização importante e superior a 50%.

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Conclusão

Na prática, não temos informação nenhuma sobre o movimento, apenas a notícia que introduziu o assunto e uma confirmação que há interesse na aquisição dos ativos. Porém, sabemos que empresas são feitas de pessoas e nos resta confiar ou não na administração. Dado tudo o que vimos até hoje, confiamos plenamente na habilidade do acionista de referência e da gestão da Suzano.

Sabendo que para avançar na cadeia de valor a Suzano exige um ativo que seja escalável e apresente alguma diferenciação, acreditamos que a IP se encaixa perfeitamente nesse perfil. Também acreditamos que a Suzano seria capaz de melhorar significativamente a operação da IP, agregando mais valor para o ativo.

Há muito nos perguntávamos qual seria o próximo movimento da Suzano que, mesmo após o Projeto Cerrado, deixa clara a intenção de investir 90% de seu fluxo de caixa operacional no crescimento de suas operações. Apesar de ainda incerto, temos maior clareza de qual será o futuro da empresa. Caso a aquisição seja concluída, o EBITDA combinado seria aproximadamente 50% maior do que o projetado para a Suzano em 2025, a tornaria a maior produtora de fluff do mundo (produto de nicho e alto valor agregado) e uma das maiores no mercado de caixas de papelão, um elo importante da cadeia de valor de papel.

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