Nesta manhã, o BCB divulgou a ata relativa a última reunião do colegiado, ocorrida na semana passada. Na ocasião, a autoridade decidiu, de forma unânime, pela manutenção dos juros em 10,5% a.a..
No documento divulgado hoje pudemos colher melhor detalhes a respeito dos fatores que motivaram a decisão, bem como maior contexto a respeito de como o BC enxerga o cenário. Sobre o comunicado, havíamos lido a mensagem como uma hábil articulação no esforço de comprar um pouco de tempo, particularmente para investigar onde se assentaria a taxa de câmbio. Houve, no entanto, aspectos percebidos como dove, particularmente a ausência de um reconhecimento explícito no sentido de assimetria altista para o balanço de riscos.
A ata, ao contrário do comunicado, vem com um tom decisivamente mais duro, mas revelando o mesmo intuito do comunicado: um BC buscando comprar tempo, tentando esquivar-se de um novo ciclo de alta salvo absolutamente necessário. A articulação disposta pela autoridade monetária é bem construída e entendemos ser o curso mais eficiente neste momento.
Em termos de cenário, o documento identifica incertezas no cenário externo, que seguem prescrevendo cautela por parte dos países emergentes num quadro de normalização dessincronizada dos juros globais. No plano interno, o comitê reconhece a resiliência da atividade, o que, num ambiente de hiato neutro, dificulta a convergência da inflação em direção à meta.
Aqui já temos a descrição de três riscos elencados na ponderação do balanço para a inflação. Desinflação mais consistente ou desaceleração mais forte lá fora, por seu impacto nas expectativas de juro, podem imprimir trajetória mais branda para a inflação local. O canal de transmissão seria de fato a taxa de câmbio. De outro lado, a resiliência da atividade poderia imprimir maior inflação de serviços, que neste estágio do processo de desinflação tem maior protagonismo. Também no sentido de alta, maior persistência da desancoragem das expectativas, bem como um mix de políticas, internas e/ou externas, que assentem o câmbio em nível desvalorizado, significariam inflação maior do que o previsto. Na ata, há clara menção de unanimidade na avaliação de que os riscos de alta se sobrepõem aos riscos de baixa, caracterizando um balanço assimétrico. Daí a necessidade de maior vigilância e cautela na ação da política monetária.
Apesar da assimetria altista, o cenário alternativo segue descrevendo um quadro no qual a manutenção dos juros assegura a convergência da inflação dentro do horizonte relevante. O risco maior parece derivar da trajetória do câmbio. O BC coloca que o movimento recente das expectativas e da moeda foi motivo de debate e que, se a deterioração se revelar perene, terá de ser devidamente incorporada pela autoridade monetária. Esta articulação revela um BC comprando tempo para observar para onde irá, em particular, a taxa de câmbio. A cerca de 5,6, pressupondo que as expectativas não piorem muito daqui, a manutenção é o suficiente, como descrito no cenário alternativo. O motivo de o BC não “comprar” o câmbio corrente dialoga com os riscos de baixa para o cenário de inflação: o ciclo de normalização nos EUA e a trajetória da inflação. Se a moeda falhar em responder à melhora externa o BC ficaria restrito em sua atuação, restando pouco insumo para retardar o movimento de novas altas. Esta percepção é reforçada quando autoridade monetária sugere que os próximos passos ficará entre duas possibilidades: i) manutenção, caso ela ainda sinalize a convergência da inflação, em linha com o cenário alterativo (leia-se, com câmbio próximo de 5,6); ii) nova alta de juros, que o BC não hesitaria em perseguir se necessário para garantir a convergência (leia-se, caso as projeções de inflação no cenário alternativo se distanciarem dos 3,2% atuais, sob um quadro de câmbio mais pressionado).
Em suma, entendemos que o conteúdo da ata foi bem articulado: fala duro e reafirma a necessidade de reancoragem das expectativas, ao mesmo tempo em que tenta preservar o grau de aperto monetário, à espera de importantes desenvolvimentos no front externo. Sinaliza de forma mais consistente à possibilidade de alta de juros, o que deve contribuir para a reancoragem das expectativas. Ao mesmo tempo, coloca que esta possibilidade dependeria de piora adicional, para a qual o câmbio deve ser a melhor expressão.
Em nossa leitura, o ambiente de “higher for longer” segue o cenário base. Este entendimento depende de leitura mais construtiva para o real, para o qual enxergamos espaço de apreciação dos níveis correntes. No exterior, a perspectiva de um ciclo mais robusto de cortes nos EUA deve enfraquecer a moeda norte-americana e evitar a necessidade de um novo ciclo de altas aqui dentro. Para esta evolução é importante que a percepção de risco recessivo nos EUA, que deu o tom na semana passada, fique distante, de tal sorte a evitar que uma dinâmica de aversão ao risco deteriore o ambiente para as moedas emergentes.