Nesta manhã, o BCB divulgou a ata relativa a última reunião do colegiado, ocorrida na semana passada. Na ocasião, a autoridade decidiu, de forma unânime, pela interrupção do ciclo de queda dos juros em 10,5%.
No documento divulgado hoje pudemos colher melhor detalhes a respeito dos fatores que motivaram a decisão, bem como maior contexto a respeito de como o BC enxerga o cenário. Sobre o comunicado, nós havíamos destacado a comunicação dura, sinalizando juros parados, mas destacamos que a barra para voltar a subir a taxa básica era alta. Em nossa visão, a ata vai ao encontro desta leitura. Inclusive, algumas inovações no documento nos parecem deixar esta barra ainda mais alta.
Em particular, nos referimos às revisões sobre o hiato de produto e taxa de juros neutra. No documento de hoje, o BC reconhece que a fortaleza recente da atividade sugere uma economia não mais operando abaixo de seu potencial, como era o caso até o último RTI (Relatório Trimestral de Inflação). O BCB, que projetava hiato negativo em 0,6% para o primeiro trimestre, agora reconhece que o hiato deve estar zerado. No que se refere ao juro neutro, a autoridade monetária anunciou a revisão a 4,75%, de 4,5% anteriormente. Vale destacar que as projeções dos cenários de referência e alternativo já partem destas novas premissas.
Quer dizer, mesmo com um juro de equilíbrio mais alto e com uma economia mais próxima do potencial, ainda assim a manutenção do juro nos patamares atuais entrega inflação praticamente na meta no ano de 2025 (3,1% vs meta de 3,0%).
O simples fato de, no cenário alternativo (de Selic constante), a inflação do ano que vem convergir à meta já nos sinalizava que a barra para altas era alta, particularmente por pressupor um ambiente de expectativas já bem desancoradas e com câmbio pressionado. Mas, até a ata de hoje, permanecia o risco de revisões altistas no juro neutro ou no hiato alterarem como as projeções do BCB neste cenário apontariam a inflação do próximo ano. Tivessem estas projeções partido de um cenário de juro neutro a 4,5% e hiato negativo, como parecia o caso até a ata, seria razoável supor que seria necessário maior grau de restrição monetária num ambiente de atividade mais forte e juro neutro mais alto. Isto, pois um hiato mais fechado (uma economia mais próxima do potencial) sinalizaria, na margem, maior pressão de demanda e inflação; ao passo que um juro neutro mais alto sugeriria que o nível de restrição de uma Selic a 10,5% seria menos intenso do que anteriormente previsto.
Por isso entendemos que a barra para subir, que já percebíamos como alta no comunicado, na realidade parece ainda maior.
Para além destas questões a ata ainda retoma o tema das expectativas. Aqui, o tom do documento é ainda mais austero do que aquele verificado no comunicado. Demais, a ata é repleta de avisos a respeito de como o risco fiscal afetaria a função reação do BC.
Em particular, no que se refere ao primeiro ponto, o documento é bastante duro no reconhecimento da necessidade, percebida de forma unânime, de combater a desancoragem das expectativas de inflação, quaisquer que sejam suas origens. No mesmo parágrafo, o BC coloca como fundamental para este processo a incisiva atuação da autoridade monetária, mas também a credibilidade do arcabouço fiscal. Em outras instâncias o BC também alerta para o fiscal e seus possíveis impactos na política monetária. A autoridade nota que a definição dos juros neutros passa por fatores que alterem a poupança doméstica, entre eles o fiscal. Demais, quando descreve o cenário externo, o BC sugere que a recente perda de correlação entre as curvas de juros de emergentes e os EUA dialoga com um ambiente de menor liquidez, que prioriza ativos com melhores fundamentos.
Em suma, entendemos que o conteúdo da ata foi muito bem articulado: fala duro e reafirma a necessidade de reancoragem das expectativas, ao mesmo tempo em que sobe a barra para um novo ciclo de alta de juros. Nesse sentido, mesmo num quadro de deterioração adicional das expectativas e do câmbio, nos parece que a variável de ajuste será a duração e não a intensidade do aperto monetário. Será “higher for longer”.
Neste quadro, esperamos estabilidade nos juros por todo este ano, encerrando nos atuais 10,5%. Já para 2025, trabalhamos com um primeiro corte na segunda reunião já do primeiro trimestre, com sucessivos cortes de 0,25 p.p até o final do ano. Desta forma, encerraríamos o próximo ano em 8,75%. Este cenário pressupõe algumas coisas, com destaque para: projeções de IPCA em 3,8% este ano e 3,4% no ano que vem, bem como um início do ciclo de cortes de juros pelo FED já em setembro deste ano. Demais, a gradual entrada do ano de 2026 no horizonte relevante de política monetária abriria espaço para o corte de juros. Isto, pois as projeções do BC devem colocar a inflação de 2026 abaixo da meta, por efeito de 2 fatores: 1) inércia, partindo de inflação na meta em 25 e; 2) nível de restrição dos juros, que ainda estaria acima do juro neutro.