Prezados investidores,
O mês de fevereiro foi marcado por diversos desenvolvimentos no campo geopolítico e econômico global. Vamos focar na parte econômica, dado que a geopolítica tem sido marcada por disputas, blefes e situações em constante desenvolvimento, tirando peso de qualquer análise estática. Além da evolução dos dados econômicos divulgados no mês, fomos impactados por diversas discussões heterodoxas, de tarifas e cortes de impostos, mudanças nas formas de arrecadação, reversão de sanções e outras, ainda em movimento. Como a maioria dessas questões ainda estão em aberto, focaremos na parte macroeconômica.
Estados Unidos
Nos Estados Unidos, fevereiro manteve o foco dos investidores na robustez econômica e nas implicações das políticas do governo Trump, especialmente após os primeiros movimentos tarifários anunciados em janeiro. A atividade econômica seguiu surpreendendo positivamente, com os dados de janeiro do mercado de trabalho mostrando criação de 230 mil vagas (acima dos 190 mil esperados) e a taxa de desemprego estável em 4,1%. Esses números, aliados à continuidade de uma inflação resiliente, reforçaram a percepção de um “excepcionalismo americano”, com crescimento forte e política monetária sob pressão hawkish. O núcleo da inflação subiu marginalmente para 0,3% no mês, interrompendo a trégua de dezembro, com destaque para a persistência em serviços, apesar da desinflação em habitação seguir avançando lentamente.
Nesse cenário, os juros recuaram em relação às máximas de janeiro, mas ainda permanecem elevados, com os juros de 10 anos próximos de 4,2%. Da mesma forma, o dólar index enfraqueceu ao longo do mês, mas encerrou acima de 107, um patamar ainda considerado alto.
A imposição efetiva das tarifas de 25% sobre México e Canadá, continuou a gerar ruídos nos mercados, com analistas divididos entre os impactos inflacionários e a possibilidade de acordos comerciais mitigarem os efeitos. Ainda assim, o mês trouxe sinais adicionais da visão do governo Trump sobre tarifas como ferramentas de política industrial e arrecadação, com rumores de novas medidas contra a União Europeia ganhando força no final de fevereiro. Esse movimento reacendeu temores de uma guerra comercial mais ampla, sustentando a força do dólar e pressionando ativos de risco globalmente.
O Fed, por sua vez, manteve a pausa nos cortes de juros na reunião de fevereiro, com Powell reforçando a necessidade de “paciência estratégica” diante de uma economia aquecida e inflação acima da meta de 2%. O comunicado trouxe poucas mudanças, mas o tom hawkish foi suficiente para reduzir as apostas em cortes já em março, com o mercado agora precificando maio como o próximo marco, na ausência de surpresas nos dados de emprego ou inflação. Continuamos vendo espaço para 3-4 cortes em 2025, mas os riscos altistas à inflação, amplificados pelo espectro tarifário e pela sazonalidade do primeiro trimestre, mantêm o Fed em alerta. Em suma, a combinação de dados sólidos e incertezas geopolíticas segue amparando o dólar e os juros, com potencial para novas surpresas vindas de Washington.
Europa
Do outro lado do Atlântico, o cenário europeu em fevereiro trouxe sinais mistos, mas ainda longe de inspirar otimismo. Os PMIs do mês mostraram uma retração menos acentuada na atividade, com o índice composto subindo marginalmente para 48,9 (de 48,2 em janeiro), sugerindo uma desaceleração no ritmo de contração. Contudo, os dados preliminares do PIB do 1º trimestre indicam crescimento próximo de zero, pressionado pela fraqueza na Alemanha e incertezas comerciais com os EUA. O risco de tarifas americanas sobre a União Europeia, ventilado no fim do mês, adicionou uma camada de preocupação, com potenciais impactos sobre exportações e investimentos.
Na inflação, o progresso continuou lento, com o índice cheio em 12 meses subindo para 2,5% (efeito-base de energia), mas o núcleo mostrando sinais de descompressão, caindo para 2,7% (de 2,9% em janeiro). A inflação de serviços, ponto-chave, segue como obstáculo, mas as médias móveis de 3 meses indicam avanço gradual na direção certa. Diante disso, o ECB optou por novo corte de 25 bps na taxa de juros, levando-a a 2,25%, em linha com o esperado. A comunicação permaneceu cautelosa, com riscos à inflação vistos como equilibrados e ao crescimento ainda baixistas. Nossa visão é de que o ECB seguirá rumo a um juro neutro (~2%) até o fim do ano, mas a fragilidade estrutural do bloco e o risco de escalada comercial limitam qualquer recuperação mais robusta.
China
Na Ásia, fevereiro foi marcado por uma postura defensiva das autoridades chinesas frente às tarifas americanas já implementadas e à ameaça de novas medidas. Os dados de atividade de janeiro, divulgados no início do mês, mostraram varejo e indústria em desaceleração, com o PMI manufatureiro caindo para 49,1, consolidando a entrada em terreno contracionista. Apesar do crescimento de 5% em 2024, a economia chinesa enfrenta ventos contrários em 2025, com exportações sob pressão e consumo interno ainda tímido.
Beijing segue em compasso de espera, com sinais de que estímulos mais robustos só virão em março, durante o Congresso Nacional do Povo, salvo escalada comercial iminente. O risco de tarifas adicionais dos EUA, especialmente após os rumores envolvendo a Europa, mantém as autoridades em alerta, com potencial para acelerar medidas de suporte à indústria e ao crédito. Enxergamos uma economia chinesa fragilizada, dependente de novos impulsos para sustentar as metas de crescimento de 2025, em um cenário onde o comércio global pode se tornar ainda mais desafiador.
Japão
No Japão, o Banco do Japão (BOJ) manteve a taxa de juros em 0,25% em fevereiro, após a alta de janeiro, mas o tom hawkish foi reforçado por projeções de inflação revisadas para cima (2,5% para março de 2026). Os dados de inflação de janeiro mostraram núcleo em 2,3%, sustentado pelo repasse de reajustes salariais, enquanto a atividade econômica deu sinais de estabilização, com PMIs industriais acima de 50 pela primeira vez em meses. A valorização do iene, que recuperou 2% frente ao dólar no mês, reflete a confiança crescente na normalização monetária.
O BOJ parece disposto a avançar com novas altas ao longo de 2025, especialmente com as negociações salariais de março no horizonte, mas mantém cautela para evitar choques de mercado. A remoção de preocupações com a economia global no comunicado sugere maior foco doméstico, o que pode sustentar o iene e os juros japoneses nos próximos meses, desde que os dados continuem favoráveis.
Brasil
No Brasil, fevereiro trouxe uma pausa na apreciação do real vista em janeiro, com a moeda oscilando entre 5,80 e 5,95, refletindo a força global do dólar e incertezas internas. A curva de juros longa subiu marginalmente, com os juros de 10 anos em torno de 14,5%, após dados de atividade de dezembro confirmarem desaceleração (varejo -0,5% e indústria -1,2% na margem). O mercado de trabalho, embora resiliente, mostra sinais iniciais de arrefecimento, com a criação de empregos formais em janeiro abaixo das expectativas.
A inflação seguiu pressionada, com o IPCA de janeiro em 0,6% e expectativas para 2025 subindo para 5,6%, puxadas por serviços e alimentos. O Banco Central elevou a Selic em 100 bps, para 13,25%, mantendo o guidance de mais uma alta em março, mas o comunicado foi interpretado como menos hawkish por alguns, ao citar riscos à atividade como limitadores da inflação. Discordamos dessa leitura: a ênfase nas expectativas desancoradas e a política restritiva sugerem continuidade do ciclo até 15,0% em junho, com pausa até o fim de 2025. Do lado fiscal, a retomada do Congresso reacendeu debates sobre a reforma do imposto de renda, com o governo buscando compensações que enfrentam resistência, elevando o risco de medidas imprudentes. Nossa visão segue cautelosa, com a desaceleração econômica e a incerteza fiscal como temas centrais ao longo do ano.